Qual a origem da palavra letramento?


Segundo Soares (2000b: 15), a palavra “letramento” surge no discurso dos especialistas nas áreas de Educação e de Ciências da Linguagem na segunda metade dos anos 80. Uma das primeiras ocorrências está no livro de Mary Kato, de 1986, em que a autora afirma que “... a chamada norma-padrão, ou língua falada culta é consequência do letramento, motivo por que indiretamente, é função da escola desenvolver no aluno o domínio da linguagem falada institucionalmente aceita”. É interessante observar que, mesmo Kato não tendo definido o que é letramento, ser letrado não se trata apenas de saber ler e escrever. A missão do professor é a de orientar o aluno na aquisição da flexibilidade linguística necessária ao desempenho adequado que lhe será exigido em sociedade.  Analisar diferentes textos compará-los, pesquisar os porquês das diferenças, construir regras sobre o uso da língua e, a partir das descobertas, reescrever textos são práticas que produzem excelentes resultados na capacitação do aluno no uso da língua. Nesse sentido, letrar é mais que alfabetizar. Alfabetizado é aquele indivíduo que sabe ler e escrever. Já letrado é aquele que sabe ler e produzir textos, dos mais variados gêneros e temas.
Um escritor competente deve saber selecionar o gênero apropriado a seus objetivos e à circunstância em que realizará seu discurso. Letrar é mais que alfabetizar. A alfabetização deve se desenvolver em um contexto de letramento como início da aprendizagem da escrita, como desenvolvimento de habilidades de uso da leitura e da escrita nas práticas sociais. Alfabetizar letrando é, portanto, ensinar a ler e escrever o mundo, ou seja, no contexto das práticas sociais da leitura e da escrita, tendo em vista que a linguagem é um fenômeno social. O processo de ensino-aprendizagem de leitura e escrita na escola não pode ser configurado como um mundo à parte e não ter a finalidade de preparar o sujeito para a realidade na qual se insere.
É importante destacar que letramento não é um método. A discussão do letramento surge sempre envolvida no conceito de alfabetização, o que tem levado a uma inadequada e imprópria síntese dos dois conceitos, com prevalência do conceito de letramento sobre o de alfabetização. Não podemos separar os dois processos, pois a princípio, o estudo do aluno no universo da escrita se dá ao mesmo tempo por meio desses dois processos: a alfabetização, e pelo desenvolvimento de habilidades da leitura e da escrita, o letramento. O letramento inicia-se muito antes da alfabetização, ou seja, quando uma pessoa começa a interagir socialmente com as práticas de letramento no seu mundo social. Como afirma Freire (1989: 11-12), (...) A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não possa prescindir da continuidade da leitura daquele. Linguagem e realidade se prendem dinamicamente. A compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura crítica implica a percepção das relações entre o texto e o contexto. Nesse sentido, se a leitura de mundo precede a leitura da palavra, um indivíduo pode ser letrado, mas não alfabetizado.

 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. São Paulo: Autores Associados, 1989.
––––––. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
KATO, Mary. No mundo da escrita: uma perspectiva psicolingüística. São Paulo: Ática, 1986. (Série Fundamentos)
SOARES, Magda. Letrar é mais que alfabetizar. In: Nossa língua – nossa pátria. Rio de Janeiro: Jornal do Brasil, 26/11/2000a. Entrevista. Disponível em <http://intervox.nce.ufrj.br/~edpaes/magda.htm>  Acesso em: julho de 2005.
––––––. Letramento: um tema em três gêneros. 2ª ed. 2ª impr. Belo Horizonte: Autêntica, 2000b.
––––––. Novas práticas de leitura e escrita: letramento na cibercultura. In: Educ. Soc., Campinas, vol.23,n. 81, p.143-160, dez.2002. Disponível em < http://www.cedes.unicamp.br> Acesso em: julho de 2005.

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